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Um dia, a gente cria coragem, junta a grana necessária, compra as passagens e vai. Todos nós levamos um sonho em comum: o intercâmbio. Nossos planos, no entanto, nem sempre são os mesmos, tampouco o modo como vivenciamos essa experiência. Basta pesquisar sobre intercâmbio para perceber o quanto existem visões díspares a respeito do local, do aprendizado, das possibilidades, enfim, do quanto valeu a pena. Não dá para crer que duas pessoas de mesma idade, sexo, naturalidade, ficaram o mesmo tempo no mesmo país e transcrevam coisas tão distintas. Quem está errado, afinal? Ninguém. Isso acontece porque nosso intercâmbio é tão único como nós. O quão impactante será a realização depende do modo como cada um de nós é, de nossos valores, prioridades, objetivos e sentimentos. E é assim também a volta para casa depois do intercâmbio.

Pensando no que dizer a respeito da adaptação na chegada e da readaptação na volta ao país de origem, decidi que não queria expor apenas uma opinião, a minha no caso. Isso seria limitador comparado à vasta imensidão de visões que existem entre aqueles que fazem um intercâmbio. Então, convidei, para um bate-papo on line, cinco mulheres que trilharam a mesma jornada que eu na ilha esmeralda e já estão de volta. Vamos à apresentação das participantes, começando por mim:

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Milene Batista Maciel, 31 anos, formada em Letras, mora atualmente em Araranguá, onde atua como escritora, revisora e professora de inglês. (Foto: Bray – County Wicklow)

 

 

 

 

 

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Natalia Graziela da Silva, 31 anos, formada em Educação Física, mora atualmente em  Araranguá/SC, onde atua como professora de Zumba. (Foto: Cliffs of Moher – Co Clare)

 

 

 

 

 

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Araceli Canova, 31 anos, formada em Administração, mora atualmente em Araçatuba/SP, onde atua como professora de inglês e bailarina. (Foto: Dada Moroccan Restaurant, Dublin)

 

 

 

 

 

 

 

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Marjorie Ferraz, 33 anos, formada em Administração, mora atualmente em Curitiba/PR, onde atua como professora de Inglês. (Foto: Diamond Hill – Connemara)

 

 

 

 

 

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Vania Tammerik Inácio da Silva, 34 anos, formada em Engenharia Civil, mora atualmente em Santo André/SP, onde atua como Engenheira Civil. (Foto: Mais um dia chuvoso em Cliffs of Moher – Co Clare)

 

 

 

 

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Eloísa Dall’Bello, 24 anos, formada em Letras, mora atualmente em Florianópolis/SC, onde cursa mestrado. (Foto: O’Connell Street)

 

 

 

 

 

 

O que fizemos durante o intercâmbio?

Todas nós fomos para Dublin estudar Inglês. A Naty é minha conterrânea e conhecida de tempos, mas não moramos em Dublin no mesmo momento. As demais eu conheci durante meu curso de inglês. A Naty, assim como eu, trabalhou como babá para duas famílias, sendo uma experiência live in (morando com a família) e outra live out (não morando com a família). A Eloísa e a Marjorie também trabalharam como babá, porém a Marjorie também atuou como barista e crew member no Burger King. A Vânia não quis cuidar dos pequenos e preferiu ser cuidadora de idosos. Já a Araceli atuou como camareira e teve a maravilhosa oportunidade de ser remunerada para fazer o que ama: dança do ventre; ela se apresentava em restaurantes e dava aulas para grupos de meninas em despedidas de solteiro.

Quanto tempo levou a adaptação em Dublin?

Com relação à adaptação em Dublin, eu posso dizer que me sentia em casa já na segunda semana depois da chegada. O mesmo parece ter acontecido com a Marjorie. A Araceli, acostumada com o calor do Brasil, acabou ficando doente e levou três meses para se adaptar. A Vânia também teve problemas de saúde, uma crise alérgica que durou um mês, mas acredita que o fato de já se comunicar bem em inglês facilitou a adaptação. Para a Eloísa, a adaptação levou um mês, por questões psicológicas. A Naty? A Naty disse que nunca se adaptou e justamente por isso era fascinante, como ela mesma disse:

“Me sentia muiiiiito feliz, acolhida, impressionada, sedenta por falar inglês e conquistar o mundo, tudo era lindo, tudo era novidade, a cidade era linda, meus amigos que estavam me ajudando eram demais, a escola era ótima, my Irish teacher was amazing, os Irlandeses sempre muito acolhedores respeitoso e divertidos…. até um dia um nacker jogar uma garrafa d’água na sacada do meu amigo e eu ficar com medo de encontrar um pelas ruas… hahahahahah.”

Quanto tempo pretendíamos ficar na Irlanda?

Perguntei para as meninas quanto tempo elas pretendiam ficar na Irlanda quando planejaram o intercâmbio e se isso havia mudado quando lá chegaram, pois eu, por exemplo, fui com a intenção de ficar por um ano, mas pouco tempo depois, já havia mudado completamente de ideia. A Naty tinha a intenção de passar seis meses em Dublin, mas acabou ficando lá por três anos. Todas as demais tinham a ideia inicial de ficar por um ano, porém, a Araceli e a Marjorie ficaram por três anos. Já a Vânia ficou dez meses, e a Eloísa, oito meses.

Os motivos que levaram a essa mudança de planos são muitos: a Marjorie disse prontamente que sempre quis ficar na Irlanda. A Vânia, ao contrário, nunca teve esse intuito e, em seguida, emendou um intercâmbio para estudar Francês no Canadá. A Eloísa citou a dificuldade de encontrar famílias que oferecessem condições boas e justas de trabalho. A Araceli mencionou o frio e a saudade da família. A Naty, por outro lado, pensava muito a respeito da qualidade de vida e da segurança que Dublin oferecia. E eu? Quis muito ficar na Irlanda, mas não para permanecer como estudante.

Viagens.

Entramos em um assunto que interessa a todos: viagens. Todas nós conseguimos viajar por países da Europa, e a Vânia até falou sobre a saudade dos voos baratos da companhia área de baixo custo. Os nomes mais citados foram: Irlanda do Norte, Inglaterra, França, Itália, Espanha e Portugal, mas a lista completa é enorme.

Como foi a readaptação no Brasil?

Como disse a Araceli: “Não foi”. Posso dizer que, um ano depois, eu ainda estou tentando me readaptar e aceitar que estou de volta ao meu país. A Naty também enfrentou essas dificuldades e, só agora, depois de três anos, é que está mais tranquila. A Vânia também achou difícil, principalmente pelo ritmo enlouquecedor da cidade onde vive e até cogitou a possibilidade de ir morar no interior. A Eloísa disse que tentou não ficar comparando as realidades para não enlouquecer. A Marjorie contou que havia se preparado bastante para a volta e já deixou claro que é algo temporário, pois pretende sair novamente do país. A Araceli já está se preparando para voltar para a Irlanda e espera que seja de forma definitiva, e ainda compartilhou:

“Não me sinto mais parte do sistema. Passei a ver os problemas do país com outros olhos, mais críticos e mais pessimistas. A Irlanda não é perfeita, mas eu me sentia mais livre, segura e tranquila mesmo tendo o que eles chamam de subemprego, e que pra mim nunca foi um problema. Não me sentia roubada antes mesmo de receber meu salário e acho que pagava um preço muito justo por todo o custo de vida.”

Todas nós voltaríamos para a Irlanda para visitar e rever pessoas. Mas eu e a Naty concordamos que não voltaríamos para ser estudante novamente, embora nos agrade muito a ideia de viver lá, se nós tivéssemos, por exemplo, outro tipo de visto ou residência. A Eloísa também disse que voltaria para viver uma nova experiência.

Novos hábitos.

Perguntei se elas haviam adquirido algum hábito que continuam praticando. A conversa divagou sobre a compra parcelada, não assistir mais TV, nível de consumismo. A Naty mencionou a compra em brechós, comer mushroom, e usar meios alternativos de transporte, como táxi e ônibus, para viajar ou ir a festas, algo que ela assume que tinha preconceito antes. A Naty e a Araceli falaram que ainda tomam chá com leite e a Eloísa passou a tomar mais café. A maioria de nós acredita que mudou muito o comportamento quanto à cordialidade, a ideia dos clássicos “sorry” e “thank you” continuam em alta conta em nosso vocabulário. A Vânia comentou que se sente mais paciente e flexível e que tem caminhado mais até porque ainda não adquiriu carro desde que voltou, e eu também não. Concordamos que nos abrimos mais para a gastronomia de outras culturas e passamos a beber vinhos e cervejas com mais qualidade e, sobretudo, quantidade – exceto a Vânia que não consome bebidas alcoólicas.

Agora é a sua vez.

É fato para todas nós o quanto essa experiência é relevante e inesquecível. Todas, de alguma forma, demonstraram saudosismo e vontade de voltar, seja para visitar ou morar.

A Irlanda é um país lindo e a amada Dublin é encantadora. Você está pronto para viver sua própria experiência na ilha esmeralda? Não tenho ideia do que acontecerá com você, mas tenho absoluta certeza de que valerá a pena e de que você sentirá saudades, como todas nós sentimos. Planeje-se, mas vá pronto para mudar de planos e, por favor, viva tão intensamente a ponto de não conseguir escolher sua foto preferida, como fizeram as minhas convidadas. A Marjorie, depois de me enviar quatro fotos, definiu a dela me dizendo: “o fato de eu estar no topo da montanha e com os braços abertos, pra mim, representa a liberdade que conquistei e a vista mais ampla das coisas”. E eu entendi muito bem o que ela quis dizer.